quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Ação popular: Da legitimidade



A legitimidade é um pressuposto processual fundamental atribuindo às partes o direito de demandar, legitimidade ativa, artigo 9º CPTA ou ser demandado, legitimidade passiva, artigo 10º CPTA.
Consagrado de forma inequívoca pela revisão constitucional de 1997, a ação popular viu o seu estatuto de instrumento de democracia participativa reforçado e ampliado através de adição das alíneas, a) e b) ao nº3 do artigo 52, cumprindo o princípio enunciado no nº 1 do artigo 3º da Constituição da República Portuguesa (CRP). A partir de agora fica mais clara a possibilidade de intervenção, ora como meio de suprir a sua inércia, omissão ou negligência, ora como reação à prática de atos ilegais, tais como, por exemplo, peculato, prevaricação e corrupção.
Esta revisão verificada em 1997 foi antecedida por dois importantes períodos para a sua evolução e consolidação:
1)      Período anterior à revisão de 1989
2)      Depois da revisão de 1989
No primeiro caso o instituto da democracia representativa apresentava-se como um texto relativamente ambíguo e tímido.
No segundo caso é introduzido no artigo 52º o nº 3, alargando o âmbito do direito de ação popular.
 Depois de necessária introdução histórica, veremos então como, na prática, o legislador ordinário, para o qual a Constituição remete, interpretou o texto constitucional e lhe deu sentido material sem diminuir o âmbito do exercício da soberania popular, ou seja, quem tem ou não tem legitimidade para ir a processo.
No âmbito da aplicação prática o artigo 9º nº 2 do CPTA trata da ação popular, ou também chamado mecanismo de extensão da legitimidade, que pode ser proposta individualmente ou em grupo. Não estão em causa neste tipo de ação interesses individuais, mas o interesse comunitário.
Este artigo lista os valores protegidos, mas não é um elenco exaustivo. Deste modo, poderão existir valores que não estando aqui expressos se enquadram no espírito do preceito.
O artigo 55º nº 2 do CPTA, atribui legitimidade aos residentes no círculo eleitoral da autarquia para impugnar atos praticados pelos seus órgãos, ou representantes através da chamada ação popular corretiva.
A atribuição de legitimidade aos residentes da circunscrição não significa que os não residentes nesse círculo eleitoral estejam inibidos de pleitear contra a entidade pública que pratique atos ofensivos dos valores protegidos elencados no nº 2 do artigo 9º, pelo contrário, é um dever de cidadania fazê-lo e que o nº 2 do artigo 9º do CPTA exige. A ideia de que se, por exemplo, um qualquer cidadão ou grupo excursionista de visita a uma qualquer localidade constatar algo que ofenda a preservação da natureza, meio ambiente e o respeito pelos princípios da boa gestão da coisa pública não possa questionar o respetivo poder instituído, nem pleitear contra ele é errada. Se assim fosse estaria em causa o princípio constitucional da soberania do povo “una e indivisível”, nº 1 do artigo 3º da CRP. A legitimidade dos residentes é uma legitimidade fundada num interesse que afeta direta individual ou coletivamente aqueles residentes. Poder-se-á dizer que o nº 2 do artigo 55º do CPTA é uma segunda modalidade de ação popular. Não é essa a posição dos não residentes cuja pretensão se funda no disposto no nº 2 do artigo 9º do CPTA.
Outra questão que nos parece importante aqui referir é a necessidade de incentivar os cidadãos a serem mais pró-ativos no exercício da cidadania. O exemplo recente dos chamados contratos “swap” ou de permuta, celebrados por Empresas do Setor Empresarial do Estado e que resultaram em prejuízos avultados para essas empresas e com consequências diretas na dívida pública, deve ser objeto de sobressalto público com a propositura de ação popular de responsabilização dos agentes públicos que celebraram esses contratos leoninos. O nº 2 do artigo 9º do CPTA acomoda perfeitamente esta questão na parte referente a “bens do estado”.
Jurisprudência sobre a tutela dos interesses difusos no Direito Português

José Rodrigues
Aluno nº 19946

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