O ponto de partida
da nossa pesquisa vai focar-se na natureza jurídica dos planos
jurídicos. Os planos assumem-se como Regulamentos, ou seja, seria de
esperar que as suas normas se apresentassem como normas
regulamentares. Mas nem sempre é assim. Há certas disposições de
planos urbanísticos que se consubstanciam em actos administrativos.
No entanto, este facto não vai ser relevante para o contencioso dos
planos pois mesmo que a disposições se apresentem como actos
administrativos, vão ser consideradas como normas regulamentares.
A classificação
dos planos, como regulamentos administrativos tem consequências
essencialmente procedimentais pois vai-nos levar a um contencioso
regulamentar. Isto é, mesmo que a norma em questão de um plano
venha a assumir-se como tendo natureza de acto administrativo, o
ordenamento e o contencioso vai considerá-la como norma
regulamentar, apenas e só por razões procedimentais e processuais.
Assim sendo, esta classificação vai remeter-nos para o regime dos
artigos 72º e seguintes do CPTA.
Como tal, a primeira
análise a ser feita é obviamente, em termos administrativos, sobre
a impugnação de normas regulamentares. Vamos encontrar, nos artigos
72º a 77º do CPTA o regime de impugnação de normas
regulamentares. Para tal, podemos elaborar um de dois pedidos: a
declaração de ilegalidade com força obrigatória geral e a
declaração de ilegalidade com efeitos restritos ao caso concreto.
Relativamente ao primeiro tipo de pedido, pode ser invocado por quem
tenha sido prejudicado pela aplicação da norma ou possa vir a
sê-lo. Só tem legitimidade para solicitar a declaração de
ilegalidade o interessado que demonstre que a norma em questão foi
desaplicada em três casos concretos, ou seja, a declaração de
ilegalidade só ganha força obrigatória geral, depois de terem
surgido três casos concretos de ilegalidade da norma em questão. Já
quanto ao segundo pedido possível, só pode ser formulado por quem
alegue ser lesado pelos efeitos de normas que se produzam na sua
esfera jurídica. Neste caso a norma não tem de depender de qualquer
outro acto concreto de aplicação. O requerente apenas quer limitar
os efeitos da declaração de ilegalidade ao seu caso concreto.
O passo que se segue
na nossa análise é a comparação das invalidades dos planos
urbanísticos com as invalidades no Direito Administrativo em geral.
As invalidades no âmbito dos planos urbanísticos são diferentes
das invalidades no Direito Administrativo em geral. Relativamente ao
Direito Administrativo sabemos que as invalidades vão-se
consubstanciar em nulidade, invocável a todo o tempo, e
anulabilidade, nos termos dos artigos 133º e seguintes do CPA. Já
no Direito do Urbanismo, o regime das invalidades encontra-se
explicitado nos artigos 101º, 102º e 103º do RJGIT. Da leitura
destes artigos podemos concluir que, tanto a inconformidade como a
incompatibilidade dos actos praticados relativamente ao plano vai ser
condição da sua validade. A sua invalidade vai-se traduzir numa
nulidade, que no Direito do Urbanísmo é a regra, ao contrário do
regime da invalidades do Direito Administrativo. A declaração de
nulidade dos planos não incide necessariamente sobre todo o
instrumento de gestão territorial. Enquanto a nulidade dos actos
administrativos é total, a invalidade dos planos pode ser parcial.
Este pormenor tem consequências gigantes para a impugnação de um
plano urbanístico.
Seguindo o caminho
na nossa análise, qual é o regime que se vai aplicar quanto à
impugnação de planos urbanísticos e as suas normas? Tanto a Lei de
Bases de Política do Ordenamento do Territorio (LBPOTU), como o
Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial referem a
existência de garantias dos pariculares mas não parece existir de
facto um regime especialmente regulado para a impugnação de
disposições do planeamento administrativo.Ora, sabemos que o regime
que o RJGIT nos apresenta, limita-se a afirmar que aos particulares
são asseguradas garantias, e sabemos ainda que se nos apresenta como
solução, uma remissão para o regime da declaração de ilegalidade
constante dos artigos 72º e seguintes do CPTA. Mas será correcto
uma remissão por completo para o CPTA? Não será que nos vamos
deparar com dificuldades de aplicação deste regime ao caso concreto
dos planos urbanísticos?
É relativamente
simples pedir a impugnação de uma norma de um plano que contenha um
vício material, pois, substancialmente, essa norma vai prejudicar
directamente o requerente. Mais, com a violação de uma norma
material essencial ao plano, a sua impugnação vai espalhar o veneno
por todo o corpo do plano, e este vai cair à mercê da impugnação
de uma só norma. Mas já quando exista a violação de uma norma
formal, ou procedimental, a impugnação desta e do plano é bem mais
dificultada ao requerente. Há uma excessiva onerosidade da
impugnação de planos com fundamento em vicios orgânicos,
procedimentais ou formais uma vez que tais vicios não se projectam
numa disposição específica directamente lesiva, mas no plano
globalmente considerado. Veja-se o caso em que o plano em questão
viola o prazo de discussão pública, ou seja, não foi cumprido o
prazo. Quando o plano está inquinado de uma norma procedimental,
qual será a norma que o requerente pode atacar? Na verdade pode
atacar todas as normas, pois todas as normas foram inquinadas, mas
nenhuma delas individualmente vai conseguir preencher os requesitos
de legitimidade do requerente. Será que tem legitimidade para a
impugnar? Também é dificil determinar qual seria o interesse
pessoal e directo do requente para pedir a impugnção de qualquer
norma. Deparamo-nos sobre um dilema essencial. Como impugnar normas
dos planos que fazem parte da sua moldura, e não do quadro? Parece
não haver
um regime estruturado das invalidades dos planos
e dos seus efeitos.
Assim sendo
parece-nos que, tal como existe uma diferenciação de regimes no que
tocas às invalidades dos planos e dos actos administrativos, também
deveria haver um regime diferente para a impugnação de planos
urbanísticos. Neste caso, um regime que preenchesse a necessidade de
garantia e tutela da confiança dos particulares.
Bibliografia:
- Alves Correia, Fernando - Manual de Direito do Urbanismo, Vol. I e III, Almedina 2004 e 2010;
- Aroso de Almeida, Mário – Manual de Processo Administrativo, Almedina, Coímbra, 2010;
- Paula Oliveira, Fernanda - A Discricionariedade de Planeamento Urbanístico Municipal na Dogmática Geral da Discricionariedade Administrativa, Almedina, Coimbra, 2011;
- Vieira de Andrade, José Carlos – A Justiça Administrativa, Lições, 11º Edição, Almedina, Coímbra, 2011;
Francisca Duarte de Almeida
Nº 20897
Subturma 6
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