I.
Introdução
O tema das Providências Cautelares
em Processo Administrativo sofreu inúmeras alterações, nomeadamente com a reforma de 2004 que não nos podem ser indiferentes, tendo sido amplamente alargado o seu
âmbito a par, das suas especificações e exigências, se não vejamos:
II.
Situação anterior
A situação anterior era, nas palavras de VIEIRA DE ANDRADE, “catastrófica”, uma vez que os processos cautelares tinham um âmbito
extremamente reduzido, reconduzindo-se praticamente a situações de suspensão da eficácia do acto, ao contrário do que sucede actualmente que foi estendido a todas as formas de
actividade administrativa.
No que dizia respeito ao objecto,
os meios cautelares apenas eram aplicados relativamente a actos administrativos
positivos, excluindo-se portanto, não só os actos negativos, mas também as
normas, ainda que fossem de aplicação imediata. (Andrade. V, 2014, cap. XIII)
Já no que diz respeito ao conteúdo, apenas existiam providências com efeitos conservatórios, ao contrário do que sucede actualmente que são previstas igualmente providências antecipatórias.
Por fim, quanto a pressupostos
para a sua adopção, exigia-se uma irreparabilidade do dano
decorrente da execução do acto da administração, aliada a um prejuízo grave para o interesse público, reiterando-se a cumulatividade necessária. Ou seja, não estava previsto aquilo que actualmente
se designa, não só em sede de Processo Civil, como
em Contencioso Administrativo por fumus
bon iuris ou “aparência do bom direito” que atende à probabilidade de
procedência ou não da acção principal. (Andrade. V, 2014, cap. XIII)
Acresce ainda que não existia igualmente ponderação de interesses, que constitui actualmente
outro dos critérios de decisão.
No entanto, após a revisão constitucional de 1997, que passou a
consagrar a protecção cautelar adequada como parte do princípio da tutela judicial efectiva dos direitos dos administrados e da
reforma de 2004, a tutela cautelar tem uma força redobrada que se traduz nos
moldes adiante descritos.
III.
A actual tutela cautelar
Refere o art. 112º do CPTA, no seu
n.º 1, que “quem possua legitimidade para intentar um processo junto dos
tribunais administrativos pode solicitar a adopção da providência ou providências
cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a
proferir nesse processo”, constituindo o n.º 2 do referido artigo uma enumeração exemplificativa das mesmas.
Ora retiramos assim de um único preceito as seguintes conclusões:
a) Através dos processos cautelares pretende-se assegurar um efeito útil da acção principal ao serviço da qual se
encontram, uma vez que o processo será normalmente mais longo uma vez
que implica que haja uma análise plena, ao contrário do que sucede nos procedimentos cautelares.
b)
Os processos cautelares não possuem portanto autonomia, devendo actuar como antecedente ou
incidente de um processo declarativo.
c)
Inclui-se na tutela cautelar
quaisquer providências julgadas adequadas pelo juíz para conferir tutela apropriada
e suficiente ao interesse do autor, ainda que provisória. (Caupers, J., 2010, pp. 401)
d)
As providências disponíveis serão não só as do n.º 2, mas ainda qualquer
outra que ao juíz pareça adequada, não havendo qualquer tipicidade aplicável. Refere ainda a possibilidade
de recorrer ainda às providências cautelares especificadas no Código de Processo Civil, ponto que VIEIRA DE ANDRADE (Andrade. V, 2014, cap. XIII) diz ser
desnecessário referir, uma vez que o próprio CPTA já confere ao juíz a possibilidade de se socorrer de qualquer espécie de providência
cautelar que lhe aprouver.
e)
São de 2 tipos as providências
cautelares:
- as conservatórias têm como objectivo fazer com se mantenha inalterável uma qualquer situação de facto ou de direito, como
forma de evitar questões prejudiciais;
- as antecipatórias pretendem uma antecipação da decisão definitiva do Tribunal referente ao processo principal. (Caupers, J., 2010, pp. 402)
Como consequência da função preventiva conferida a este tipo de tutela, a generalidade da
doutrina aponta como características típicas, a instrumentalidade –
decorrente da dependência da acção principal, a provisoriedade –
uma vez que ainda haverá a resolução definitiva do litígio, e a sumaridade – em consequência de a situação de facto e de direito não será analisada a fundo como seria num processo sem carácter urgente, até porque todo procedimento é extremamente célere,
apenas havendo lugar a possível contestação no prazo de 10 dias após a citação do Requerido, seguindo-se um prazo de 5 dias para a decisão do juíz (114º a 119º do CPTA). (Caupers, J., 2010, pp. 407)
IV.
A decisão sobre a concessão da providência cautelar – Periculum
in mora e fumus bon iuris
O art. 120º do CPTA estabelece
como requisito o periculum in mora,
quando exige que “haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo
principal.
A este propósito, é VIEIRA DE ANDADE da opinião que tanto será relevante o periculum in mora
de infrutuosidade, aplicando-se então uma providência conservatória, como o de retardamento, que cominará com a adopção de uma providência antecipatória. (Andrade. V, 2014, cap. XIII) Far-se-á portanto um juízo de prognose de modo a entender se
haverá ou não razões para recear a inutilidade da
sentença definitiva pela demora da decisão.
Assim, deverão ser tidos em conta, como resulta da lei, todos os prejuízos relevantes para o interesse do requerente, quer seja no caso um
particular, o Ministério Público ou um dos autores populares.
Outro requisito actual e que cada
vez tem adquirido maior relevância é então o do fumus bon iuris, igualmente denominado por parte da doutrina como “aparência
do direito” ou do “bom direito”.
Nesta sede, terá o juíz titular do processo que, no caso
concreto, avaliar em termos probabilísticos, a existência do direito ou
ilegalidade invocados. (Andrade. V, 2014, cap. XIII)
O papel deste requisito torna-se
decisivo uma vez que a lei permite em determinados casos “que o juíz decrete a providência que considere adequada, ainda que sem prova do
receio de facto consumado ou da difícil reparação do dano e independentemente dos prejuízos que a concessão possa virtualmente causar ao interesse público ou aos contra-interessados”. (Andrade. V,
2014, cap. XIII) O critério para
que tal suceda será o da evidente procedência da acção.
Poderá assim estabelecer-se uma gradação quanto a este critério, que nos
é apresentada por VIEIRA DE ANDRADE e que permite concluir que a lei se basta
com um juízo negativo de não-improbabilidade de procedência da acção principal para que se possa
conceder a tutela cautelar. Ora, é precisamente aqui que reside o ponto fulcral
da questão que, aliado ao alargamento dos tipos de
providências cautelares, confere um amplo poder e garantia aos particulares e
um papel central de prognose ao juíz.
Já o professor AROSO DE ALMEIDA, o CPTA atribui relevância diferenciada
a este critério, conforme se trate de uma providência conservatória ou antecipatória. (Almeida. A,
2014, pp. 477)
No primeiro caso a providência é
concedida a menos que “seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular ou a existência de circunstâncias que obstem
ao seu conhecimento de mérito”.
No segundo, ainda que demonstrado
o periculum in mora, apenas será concedida quando se admita que a pretensão pode vir a ser julgada procedente. O critério obtém maior relevo uma
vez que se pretende alterar o status quo,
sendo necessária um verdadeiro fumus bon iuris ou aparência
de bom direito. (Almeida. A, 2014, pp. 478)
V.
Conclusão
Poderemos concluir portanto que a
tutela cautelar se encontra amplamente alargada face ao que sucedia
anteriormente, cabendo ao juíz, casuisticamente, uma avaliação ponderada dos interesses em jogo e condicionada pelo princípio da proporcionalidade, não podendo o Tribunal conceder mais
do que o indispensável para evitar lesões dos interesses do Requerente – art. 120º/3, 1ª parte.
A decisão é tomada com base em informação insuficiente, dada a celeridade
necessária para uma tutela cautelar e meramente
provisória, decretando-se a providência nos
termos do art. 120º do CPTA nos casos aí previstos.
Assim, na minha opinião e dada a importância que uma adequada tutela cautelar tem, o juíz adquire um papel reforçadamente fundamental porquanto analisa
factos, por si só insuficientes e sem possibilidade de
discussão, devendo efectivamente atender aos dois
critérios – periculum in mora e fumus bon iuris em conjunto, conferindo
sem dúvida, maior relevância ao segundo, ainda que seja uma mera prognose,
uma vez que está imbuído de amplos poderes, nomeadamente
quanto ao tipo de providência a adoptar, podendo inclusive conceder uma
diferente da solicitada.
Biliografia:
Almeida, Mário Aroso – “Manual de Processo Administrativo”, Almedina,
2014
Andrade, José Vieira de - “A Justiça
Administrativa – Lições”, 13ª Edição, Almedina, 2014
Caupers, João - “Introdução ao
Direito Administrativo”, 10ª edição refundida, Almedina,
2010
Ana Catarina Sampaio
n.º 21995
Ana Catarina Sampaio
n.º 21995
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