domingo, 7 de dezembro de 2014

Anteprojeto de revisão do CPTA: O que muda no artigo 128




O regime previsto no atual artigo 128 do CPTA mostra que em matéria de contencioso administrativo ainda há muito a fazer para estabelecer os necessários equilíbrios entre o interesse dos particulares e os da administração, por isso, a reforma em curso é muito bem-vinda, só perca por tardia.
O projeto de revisão propõe alterar o regime de suspensão de eficácia do ato administrativo, entre outras alterações previstas, no caso em análise, o legislador procura corrigir as disfuncionalidades do regime satisfazendo de certo modo as críticas de que este tem sido alvo. Será que a proposta contida neste projeto resolve o problema? A solução encontrada é consensual? Há espaço para outras soluções? É com base nestas questões que este trabalho se irá desenvolver, fazendo uma análise necessariamente sucinta entre o regime atual e o que propõe o projeto de revisão do CPTA.
O regime do atual nº 1 do artigo 128 do CPTA, prevê a obrigatoriedade de a Autoridade Pública (AP) emitente do ato, suspendê-lo ou não lhe dar inicio, sempre que seja interposta uma providência no sentido de evitar que a decisão da AP cause prejuízos irreparáveis ao proponente. Todavia, a AP pode reagir, (leia-se: pode sempre[1]) atacando a decisão com fundamento em prejuízo grave para o interesse público, suspendendo a proibição de iniciar ou prosseguir o ato decidido, nos termos e prazo previsto no preceito, i, e, é-lhe permitido decidir por si própria, sem a intervenção do juiz. Sendo parte no processo não é aceitável que a AP disponha de uma capacidade de intervenção que viola claramente o princípio da igualdade. Tal como diz, nas suas lições, o Professor Vasco da Silva Pereira, estes poderes da AP são o resultado dos traumas da infância difícil do Contencioso Administrativo.
Sobre o assunto diz Diogo Calado o seguinte; é neste ponto que o sistema do CPTA se afasta do regime em que se inspirou, a lei processual administrativa alemã. É que se é verdade que na lei alemã existe também o efeito suspensivo automático da execução do ato, bem como, a possibilidade de emissão de resolução fundamentada em casos de grave prejuízo para o interesse público, permitindo-se à administração a execução do ato, é também reconhecido ao juiz administrativo a competência para, a pedido do particular, repor o efeito suspensivo. Ora ao não transportar também este trecho o legislador português ficou a “meio da ponte”[2]. Com esta reforma da reforma, tem o legislador atual a oportunidade de concluir a passagem.  
Nos termos dos números 2 a 4 do artigo 128, o requerente pode pedir a declaração de ineficácia do ato quando se conclua que os fundamentos contidas na resolução emitida pela AP não procedem, mas neste tipo de atos o tempo é fundamental podendo ser tarde para reparar o direito irremediavelmente violado.
Sendo necessário que o regime não permita que por mero capricho o particular obstaculize o desenvolvimento de políticas de interesse público e muitas vezes de execução urgente, essa necessidade não justifica que se desproteja a outra parte, neste caso o particular. Estão em causa valores e direitos constitucionalmente protegidos que não podem ser violados, nº 1 do artigo 266.
Importa agora saber que solução o projeto antecipa, qual a posição do Regente sobre a controvérsia e se a sua posição é concordante com a proposta do projeto de revisão do CPTA.

Da redação proposta no projeto de revisão do CPTA releva o seguinte: 1) mantem-se a regra do nº 1 do artigo 128 no que diz respeito à consagração da proibição da execução do ato, sempre que haja um requerimento nesse sentido. 2) No pedido de levantamento da proibição da execução do ato, deixa de constar prejuízo grave para o interesse público, substituído pelo termo “salvo em caso de necessidade”, sendo esta apenas admitida em situações de urgência máxima. 3) Agora é a AT emitente do ato ou os interessados que têm que requerer ao juiz o levantamento da suspensão, o juiz passa a intervir no processo, avaliando se há ou não prejuízo grave para o interesse público, ponderando o interesse das partes.
A invocação do estado de necessidade em substituição do “grave prejuízo para o interesse público” para que seja levantado o efeito suspensivo, é uma alteração muito significativa exigindo que os seus prossupostos sejam observados pela AT, porque a sua inobservância acarreta graves consequências para a Administração nos termos do artigo 3º do CPA e artigos 16º, 7º e 8º da lei 67/2007.
Como se pode verificar através desta breve análise sobre o que da mais significativo muda com a reforma da reforma no artigo 128 do CPTA, direi que o legislador apresenta soluções que não são exatamente coincidentes com o sistema alemão vigente não obstante se tenha nele inspirado i, e, em vez de terminar “a travessia da ponte” iniciada na reforma 2002/2004, optou por ser a entidade requerida a requerer ao juiz o levantamento da suspensão não permitindo que seja o particular a requerer a reposição do efeito suspensivo como defende o sistema alemão.  
 No meio da controvérsia, importa perceber a posição do Professor Vasco da Silva Pereira Regente da cadeira. Não conheço a posição do Professor sobre a reforma da reforma quanto a este caso concreto, mas conheço a crítica que faz nas suas lições das aulas teóricas sobre o regime atual do artigo 128, defendendo a solução alemã, por isso suponho que não se sinta totalmente satisfeito com a solução proposta no projeto de revisão em curso. Se vingar a proposta provavelmente continuará a incluir o texto do novo artigo 128 nos casos resultantes da “infância difícil” do Contencioso Administrativo aos modernos “traumas “do Processo administrativo”.
Em conclusão, pode-se afirmar que as alterações que esta reforma da reforma propõe vão no bom sentido, responde de certo modo às críticas que são feitas ao atual regime, por isso andou bem o legislador nesta matéria, pode-se questionar se o caminho agora seguido é o melhor ou se não devia concluir aquilo que ficou a meio na reforma 2002/2004, entendo que seria mais avisado seguir o modelo alemão por proteger mais o particular.

Bibliografia
Almeida, Mário Aroso de – Manual de Processo Administrativo, reimpressão. Almedina. Páginas 459 a 467
Calado, Diogo – O novo regime da suspensão de eficácia de ato Administrativo no âmbito das providências cautelares impugnatórias - Anteprojeto de revisão do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais em debate AAFDL 2014

José Rodrigues
Aluno nº 19946 


[1] Calado Diogo. O novo regime da suspensão de eficácia de ato Administrativo no âmbito das providências cautelares impugnatórias - Anteprojeto de revisão do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais em debate AAFDL 2014, página 209
[2] Calado Diogo. O novo regime da suspensão de eficácia de ato Administrativo no âmbito das providências cautelares impugnatórias - Anteprojeto de revisão do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais em debate AAFDL 2014, página 211

1 comentário: