O regime previsto no
atual artigo 128 do CPTA mostra que em matéria de contencioso administrativo
ainda há muito a fazer para estabelecer os necessários equilíbrios entre o
interesse dos particulares e os da administração, por isso, a reforma em curso
é muito bem-vinda, só perca por tardia.
O projeto de revisão
propõe alterar o regime de suspensão de eficácia do ato administrativo, entre
outras alterações previstas, no caso em análise, o legislador procura corrigir
as disfuncionalidades do regime satisfazendo de certo modo as críticas de que
este tem sido alvo. Será que a proposta contida neste projeto resolve o
problema? A solução encontrada é consensual? Há espaço para outras soluções? É com
base nestas questões que este trabalho se irá desenvolver, fazendo uma análise necessariamente
sucinta entre o regime atual e o que propõe o projeto de revisão do CPTA.
O regime do atual nº 1 do
artigo 128 do CPTA, prevê a obrigatoriedade de a Autoridade Pública (AP) emitente
do ato, suspendê-lo ou não lhe dar inicio, sempre que seja interposta uma
providência no sentido de evitar que a decisão da AP cause prejuízos
irreparáveis ao proponente. Todavia, a AP pode reagir, (leia-se: pode sempre[1])
atacando a decisão com fundamento em prejuízo grave para o interesse público,
suspendendo a proibição de iniciar ou prosseguir o ato decidido, nos termos e prazo previsto no
preceito, i, e, é-lhe permitido decidir por si própria, sem a intervenção do
juiz. Sendo parte no processo não é aceitável que a AP disponha de uma
capacidade de intervenção que viola claramente o princípio da igualdade. Tal
como diz, nas suas lições, o Professor Vasco da Silva Pereira, estes poderes da
AP são o resultado dos traumas da
infância difícil do Contencioso Administrativo.
Sobre o assunto diz Diogo
Calado o seguinte; é neste ponto que o
sistema do CPTA se afasta do regime em que se inspirou, a lei processual
administrativa alemã. É que se é verdade que na lei alemã existe também o
efeito suspensivo automático da execução do ato, bem como, a possibilidade de
emissão de resolução fundamentada em casos de grave prejuízo para o interesse
público, permitindo-se à administração a execução do ato, é também reconhecido
ao juiz administrativo a competência para, a pedido do particular, repor o
efeito suspensivo. Ora ao não transportar também este trecho o legislador
português ficou a “meio da ponte”[2]. Com
esta reforma da reforma, tem o legislador atual a oportunidade de concluir a
passagem.
Nos
termos dos números 2 a 4 do artigo 128, o requerente pode pedir a declaração de
ineficácia do ato quando se conclua que os fundamentos contidas na resolução
emitida pela AP não procedem, mas neste tipo de atos o tempo é fundamental
podendo ser tarde para reparar o direito irremediavelmente violado.
Sendo necessário que o
regime não permita que por mero capricho o particular obstaculize o
desenvolvimento de políticas de interesse público e muitas vezes de execução
urgente, essa necessidade não justifica que se desproteja a outra parte, neste
caso o particular. Estão em causa valores e direitos constitucionalmente
protegidos que não podem ser violados, nº 1 do artigo 266.
Importa agora saber que
solução o projeto antecipa, qual a posição do Regente sobre a controvérsia e se
a sua posição é concordante com a proposta do projeto de revisão do CPTA.
Da redação proposta no
projeto de revisão do CPTA releva o seguinte: 1) mantem-se a regra do nº 1 do
artigo 128 no que diz respeito à consagração da proibição da execução do ato,
sempre que haja um requerimento nesse sentido. 2) No pedido de levantamento da
proibição da execução do ato, deixa de constar prejuízo grave para o interesse público,
substituído pelo termo “salvo em caso de
necessidade”, sendo esta apenas admitida em situações de urgência máxima. 3) Agora é a AT emitente do ato ou os
interessados que têm que requerer ao juiz o levantamento da suspensão, o juiz
passa a intervir no processo, avaliando se há ou não prejuízo grave para o
interesse público, ponderando o interesse das partes.
A invocação do estado de
necessidade em substituição do “grave prejuízo para o interesse público” para
que seja levantado o efeito suspensivo, é uma alteração muito significativa
exigindo que os seus prossupostos sejam observados pela AT, porque a sua inobservância
acarreta graves consequências para a Administração nos termos do artigo 3º do
CPA e artigos 16º, 7º e 8º da lei 67/2007.
Como se pode verificar
através desta breve análise sobre o que da mais significativo muda com a
reforma da reforma no artigo 128 do CPTA, direi que o legislador apresenta
soluções que não são exatamente coincidentes com o sistema alemão vigente não
obstante se tenha nele inspirado i, e, em vez de terminar “a travessia da ponte” iniciada na reforma 2002/2004, optou por ser
a entidade requerida a requerer ao juiz o levantamento da suspensão não
permitindo que seja o particular a requerer a reposição do efeito suspensivo
como defende o sistema alemão.
No meio da controvérsia, importa perceber a
posição do Professor Vasco da Silva Pereira Regente da cadeira. Não conheço a
posição do Professor sobre a reforma da reforma quanto a este caso concreto,
mas conheço a crítica que faz nas suas lições das aulas teóricas sobre o regime
atual do artigo 128, defendendo a solução alemã, por isso suponho que não se
sinta totalmente satisfeito com a solução proposta no projeto de revisão em
curso. Se vingar a proposta provavelmente continuará a incluir o texto do novo
artigo 128 nos casos resultantes da “infância
difícil” do Contencioso Administrativo aos modernos “traumas “do Processo
administrativo”.
Em conclusão, pode-se
afirmar que as alterações que esta reforma da reforma propõe vão no bom
sentido, responde de certo modo às críticas que são feitas ao atual regime, por
isso andou bem o legislador nesta matéria, pode-se questionar se o caminho agora
seguido é o melhor ou se não devia concluir aquilo que ficou a meio na reforma
2002/2004, entendo que seria mais avisado seguir o modelo alemão por proteger
mais o particular.
Bibliografia
Almeida, Mário Aroso de –
Manual de Processo Administrativo, reimpressão. Almedina. Páginas 459 a 467
Calado, Diogo – O novo
regime da suspensão de eficácia de ato Administrativo no âmbito das
providências cautelares impugnatórias - Anteprojeto de revisão do Código de
Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais em debate AAFDL 2014
José
Rodrigues
Aluno nº
19946
[1] Calado
Diogo. O novo regime da suspensão de eficácia de ato Administrativo no âmbito
das providências cautelares impugnatórias - Anteprojeto de revisão do Código de
Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais em debate AAFDL 2014, página
209
[2] Calado
Diogo. O novo regime da suspensão de eficácia de ato Administrativo no âmbito
das providências cautelares impugnatórias - Anteprojeto de revisão do Código de
Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais em debate AAFDL 2014, página
211
Visto.
ResponderEliminar