PRINCIPIO PRO
ACTIONE COMO COROLÁRIO DO PRINCIPIO DA TUTELA JURISDICIONAL EFECTIVA
Tal como
nos demais ramos de Direito Processual, estão subjacentes às normas que regulam
o Contencioso Administrativos, princípios. Como refere OLIVEIRA ASCENSÃO os
princípios gerais do direito são grandes orientações formais subjacentes na ordem
jurídica, que fundam e unificam normas em soluções singulares. (Ascensão, 2005, pp. 460)
Há
depois que destrinçar ainda princípios processuais, nomeadamente em sede de
processo administrativo, que tornam possível clarificar-se a forma como se
“compatibiliza as finalidades da fiscalização da legalidade e da defesa do
interesse público com as da protecção dos direitos e interesses legalmente
protegidos dos cidadãos”, prosseguindo-se deste modo aquilo que se pretende com
o Direito Processual Amdinsitrativo. (Andrade,
2013, pp. 420)
São
estes princípios que permitem ao intérprete da lei, entender o fundamento da
mesma, bem como a sua razão de ser, possibilitando a integração de lacunas e
uma melhor prossecução dos objectivos da norma.
VIEIRA
DE ANDRADE, indica-nos duas ideias estruturantes dos processos:
- o
processo prossegue os interesses das partes nele intervenientes, assegurando um
processo justo e equitativo na medida do possível, atribuindo ao juíz uma “função
de árbitro”, cabendo-lhe aferir o cumprimento das normas processuais;
- o
processo tem ainda como objectivo a prossecução de interesses públicos,
externos aos intervenientes no mesmo, impondo uma intervenção autónoma das “autoridades
judiciárias”. (Andrade, 2013, pp. 420)
Importante
é não esquecer, que não deixa o procedimento administrativo de estar sujeito
aos princípios presentes na Constituição e transversais a todo o Direito e não
somente específicos do processo, que constituem padrões de conduta e valoração,
como sendo os princípios da igualdade, da boa-fé, da protecção da confiança,
entre outros.
São
decerto variadíssimas as possibilidades de agrupamento dos princípios, bem como
os próprios princípios indicados pela doutrina, seguindo-se no entanto, para
efeitos da presente análise, a ideia proposta feita pelo professor VIEIRA DE
ANDRADE, que os divide em 2 grupos: princípios relativos à promoção ou
iniciativa processual e princípios relativos à prossecução processual,
englobando este último as fases do decurso, condução e extinção do processo.
No
primeiro grupo, apresenta-nos 3 princípios: o da necessidade do pedido, o da
vinculação do juíz ao mesmo e o da limitação o juíz pela causa de pedir,
equivalente ao princípio da substanciação em processo civil. Estão portanto,
inseridos nesta categoria, todos os princípios relacionados com o impulso
processual e acção do juíz em conformidade com o que é pretendido pelo/s
Autor/es.
Já no
segundo conjunto, encontram-se princípios como o da tipicidade, compatibilidade
processual e adequação formal da tramitação, princípio do dispositivo e da
auto-responsabilidade das partes, princípio do contraditório, princípio da
devolução facultativa ou da suficiência discricionária e, finalmente, o
princípio que estará no centro da presente análise: do favorecimento do
processo ou pro actione.
Estão
assim presentes na segunda categoria aqueles que contribuem para um processo célere
e justo, indispensáveis para que seja dado cumprimento ao princípio da tutela
jurisdicional efectiva, expresso no art. 2º do CPTA que refere numa enumeração
exaustiva aquilo que se pretende com o processo administrativo que nomeadamente
“compreende o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que
aprecie, com força de caso julgado, cada pretensão regularmente deduzida em
juízo, bem como a possibilidade de a fazer executar e de obter as providências
cautelares, antecipatórias ou conservatórias, destinadas a assegurar o efeito
útil da decisão.” Ora, este normativo nada mais é do que uma concretização do
art. 268º/4 da CRP que sob a epígrafe “direitos e garantias dos administrados”
lhes oferece o direito ao procedimento administrativo para impugnação de actos
e reconhecimento de direitos que tenham sido preteridos.
Referem-nos
os professores DIOGO FREITAS DO AMARAL e MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, a propósito das
«Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo” e mais concretamente deste princípio que “a cada direito corresponde uma acção e esse deverá ter uma tutela adequada por parte
da jurisdição efectiva”. (Amaral e Almeida, 2004, pp. 53)
Esta
tutela jurisdicional efectiva é conseguida através de uma intervenção judicial direcionada
e adequada à pretensão em juízo, efectiva e tão rápida quanto possível,
flexível de modo a evitar alongamentos excessivos da instância, permitindo que
o processo se adapte a determinadas vicissitudes e ainda, estável, através de
decisões definitivas que adquirem força de caso julgado. (Caupers, 2010, pp. 427)
FREITAS
DO AMARAL e AROSO DE ALMEIDA vão mais longe, e dividem em 3 vertentes,
apresentando-nos o plano da tutela declarativa que prossegue precisamente a
obtenção em prazo razoável da decisão com força de caso julgado, o plano da
tutela cautelar, que permite a adopção de determinadas providências de modo a
evitar a perda irremediável de determinados direitos e, o plano da tutela
executiva que materializa no campo factual a decisão com força de caso julgado (Amaral e Almeida, 2004, pp. 53 a 55)
Como
concretização deste princípio e, portanto corolário normativo, surge o
princípio da favorecimento do processo, comummente referido na jurisprudência
como princípio pro actione. VIEIRA DE
ANDRADE entende que este é prosseguido através de uma “interpretação e
aplicação das normas processuais no sentido de favorecer o acesso ao tribunal
ou de evitar situações de denegação de justiça, designadamente por excesso de
formalismo”. (Andrade, 2013, pp. 439)
É certo
que uma das principais queixas apresentadas contra a justiça actual, seja ela
administrativa ou cível, prende-se com a demora dos processos nos Tribunais,
com o excesso de burocracia e com os elevados custos. O princípio em análise, tenta a meu ver, precisamente fornecer ao juíz instrumentos que tornem a defesa dos direitos dos
particulares mais eficaz, prosseguindo a sua protecção de direitos e mais
eficiente, isto é, de forma adequada e sem custos desproporcionais. (Andrade, 2013, pp. 439)
Esta
ideia foi aperfeiçoada com a reforma Administrativa de 2004, com o objectivo de suprir as
deficiências normativas anteriormente existentes e fornecer a melhor resposta
possível às mesmas. Um dos principais objectivos apontados pela doutrina foi o
de assegurar uma decisão de mérito, evitando dentro da medida do possível, decisões
formais injustificadas, designadamente nos casos semelhantes a outros revelados
anteriormente. (Andrade, 2013, pp. 440)
Neste
sentido, surge o art. 7º que estatui que “as normas processuais devem ser
interpretadas no sentido de promover a emissão de pronúncias sobre o mérito das
pretensões formuladas”.
No
fundo, o que se pretende com este princípio é evitar delongas processuais que
poderão ser supridas através de uma actuação diligente e cuidada do juíz, com a
adaptação do processo a novas circunstâncias, em determinados casos, como p.e.
na cumulação de pedidos em processos urgentes (Andrade,
2013, pp. 441), ou na emissão
de uma decisão de mérito sempre que esta seja possível e justa. Prossegue assim
uma eliminação de “obstáculos infundados e desproporcionados” que levam
recorrentemente às incontáveis decisões de forma. (Amaral, Almeida, 2004, pp. 81).
É minha
opinião que não deixa de ser possível e interessante estabelecer neste ponto um
paralelismo com o art. 278º/3 do actual CPC que, com o mesmo objectivo, permite ao
juíz que - ainda que na presença de excepções dilatórias, que normalmente
determinariam a absolvição do Réu da Instância, impondo ao Autor que interponha
nova acção caso pretenda a prossecução do seu direito, eliminando ou corrigindo
o que está por base da excepção - possa “ainda que subsistam (as
excepções dilatórias), não tem lugar a absolvição da instância quando,
destinando-se a tutelar o interesse de uma das partes, nenhum outro motivo
obste, no momento da apreciação da exceção, a que se conheça do mérito da causa
e a decisão deva ser integralmente favorável a essa parte”. Deste modo,
obter-se-á assim uma decisão de mérito, evitando-se uma decisão meramente
formal. O processo ficará deste modo concluído, não sendo possível outro com o mesmo pedido e causa de pedir – absolve-se o Réu do pedido e não somente da instância.
Outro
exemplo deste favorecimento e promoção do processo reflecte-se, tal como sucede
no processo civil, que sofreu recentemente também uma profunda reforma, no
facto de o CPTA permitir a substituição da Petição Inicial, determinando apenas
que se considere como recepcionada na data do primeiro registo, de modo a não
comprometer a sua tempestividade. (Amaral,
Almeida, 2004, pp. 81)
Não é
ao acaso que variada doutrina denomina este princípio de anti-formalista e a
própria jurisprudência recorrentemente se socorre do mesmo, indicando a título
de exemplo o Ac. 0850/07 do Supremo Tribunal Administrativo que refere a
propósito de um caso que implica a aplicação da lei no tempo do próprio CPTA
relacionado com “o prazo de um recurso contencioso de anulação (hoje acção administrativa
especial)” que o princípio pro actione
deverá ser tido em conta “de forma a impedir que a rígida aplicação das regras
processuais possam por em causa o exercício do direito fundamental de acesso ao
direito e, em consequência” admite o recurso.
É deste
modo possível concluir que, há no Direito Processual Administrativo além de uma cada vez mais acentuada proximidade ao Direito Processual Civil, uma crescente
preocupação com a tutela dos direitos do particular, como não poderia deixar de
ser. Como? Através da prossecução de uma justiça mais rápida e eficaz, com a eliminação
de fases ou procedimentos meramente dilatórias que possam prejudicar as partes
e colocar em causa as suas legítimas expectativas.
Bibliografia:
1 – Amaral, Diogo Freitas e
Almeida, Mário Aroso de - “Grandes Linhas da Reforma do Contencioso
Administrativo”, 3ª edição, Almedina, 2004
2 – Andrade, José Vieira de - “A Justiça
Administrativa – Lições”, 13ª Edição, Almedina, 2014
3 – Ascensão, José de
Oliveira - “O Direito – Introdução e Teoria Geral”, 13ª edição refundida,
Almedina, 2005
4 – Caupers, João - “Introdução
ao Direito Administrativo”, 10ª edição refundida, Almedina, 2010
Jurisprudência: AC do Supremo Tribunal
Administrativo http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/565a663fef4f1931802574420034b2e1?OpenDocument&ExpandSection=1
Ana Catarina Sampaio, n.º 21995
Visto.
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